O real arrasa tudo - Isabel de Sá

O real arrasa tudo - Isabel de Sá

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«O que sucede à arte de Isabel de Sá é um bizarro modo de dúvida. Seja na poesia ou nas artes plásticas, a autora coloca-se como alguém perplexo perante o passado mais ávido ou empenhado, como assumindo que, na verdade, sendo tudo tão inevitável, não mudará nada.

O mundo, afinal, segue à revelia da arte, por mais utopias que se possam nutrir. Neste sentido, Isabel de Sá não destrói a sua arte, não destrói o passado, mas tem a coragem assombrosa de se tornar distante, de se acusar como autora tornando-se sua própria contestatária. Vai ao longe de si mesma e não aceita qualquer deslumbre. Quando antes se debatia frontalmente com os nervos de protestar, interferir, hoje ironiza qualquer fúria e possibilidade de inscrição.

Estrear um livro em 2019, recolhendo o muito raro que foi escrito em década e meia, é prova do que se diz atrás. O real, feito do concreto de viver, cheio de comezinho e alterações de planos, acaba por se impôr. Arrasa tudo. A arte, de algum modo, sendo maravilhosa e indutora de satisfações, não se lhe sobrepõe. É uma patologia pela qual temos maior ou menor consideração, conforme a qualidade de maior ou menor lucidez que saibamos exercer.»

Valter Hugo Mãe

CRÍTICAS DE IMPRENSA

Do pouquíssimo que escreveu na última década e meia se faz este livro breve mas poderoso, um dos primeiros da coleção "elogio da sombra", coordenada por Valter Hugo Mãe. "O real arrasa tudo" é o retrato de um mundo minado "por todos os poderes", onde "a verdade não existe", o caos alastra, e talvez já seja tarde "para quase tudo".
No meio dos escombros, numa paisagem tocada pelo "belo horrível da insanidade", o sujeito poético entrega-se à desconfiança sistemática e a um ceticismo perplexo.
Mesmo se a escrita aparentemente serve de pouco ("O poeta é só paleio"), importa ainda assim "retardar o declínio". Como? Acreditando numa arte que se quer "insubmissa", "desobediente", "insurrecta". Procurando os extremos: abismo e esplendor, desolação e júbilo, tragédia e paraíso. Olhando para as coisas com o desprendimento de quem já deixou de se preocupar com o que os outros pensam: "A obra é minha."

José Mário Silva, Expresso

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