Cinco Peças Breves
Cinco Peças Breves
Cinco peças breves, cinco exemplos da privilegiada plasticidade formal assegurada pelo formato reduzido, cinco experiências representativas da variedade do tecido teatral português, cinco desafios éticos e políticos à padronização dos nossos tempos, cinco diferentes possibilidades de entrada na renovada dinâmica da dramaturgia portuguesa contemporânea.
Don Juan em sua companhia, de Regina Guimarães. A peça foi estreada pelo Teatro Só em Novembro de 2000, no Teatro Latino, no Porto. Revisitação incontornavelmente intertextual do mito (a autora nomeia, entre outros, Molière, Baudelaire e António Patrício), Don Juan em sua companhiaopera a sua concentração ao nível das personagens, reduzidas ao próprio Don Juan, a Dona Elvira e ao Criado, entregues a um jogo tão fascinado pelos recursos do teatro como pela "madrasta literatura", de que as quase poéticas didascálias são exemplo eloquente.
Homem Mau, de Rui Guilherme Lopes. O autor tem vindo, nomeadamente através das suas colaborações com Pedro Carraca, a contribuir para a renovação da linguagem teatral portuguesa. homem mau teve a sua estreia em Março de 2000, no espaço d'A Capital, resultado de uma co-produção entre os Artistas Unidos e o depois da uma - teatro?, estrutura de que o próprio dramaturgo é fundador. Partilhando uma preocupação comum a alguma da dramaturgia contemporânea, este texto parte, nas palavras do seu próprio autor, "de uma interrogação acerca da capacidade de o homem ser extraordinariamente violento com os outros homens". A sua inclusão neste volume serve também para ilustrar a exploração das possibilidades e dos recursos da forma monologada.
O vento que vem, de Luís Fonseca. O vento que vem, integra-se num conjunto de criações dramáticas que o autor tem vindo a apresentar na Comuna - Teatro de Pesquisa, tendo este sido estreado em Dezembro de 2000, com encenação de Álvaro Correia. Exemplo de uma "alongada" forma "breve", este texto é também um exercício de vozes, paradoxalmente, entregues à expressão das dificuldades de se fazerem escutar, explorando diferenças geracionais e outras nas modalidades possíveis de relação com o mundo, entre a memória da acção e a paralisia.
A Portageira da Brisa, de Carlos J. Pessoa. Estreado em Outubro de 2001, integrado num espectáculo com o título Tríptico TEC - é, como o seu próprio título sugere, um exemplo representativo da idiossincrática escrita dramática de Carlos J. Pessoa, o experimentado dramaturgo e encenador do Teatro da Garagem, no cruzamento de registos e na tensão entre um inegável apelo teatral e uma evidente pulsão retórica. Aqui tudo se passa no mais radical e quotidiano dos "não-lugares", a auto-estrada, espaço para uma ficção de recorte trágico entre uma "portageira da Brisa" e José Amílcar, um comum condutor.
Passagem, de Pedro Eiras, toma como intertexto estruturante da convenção linguística em que faz assentar a sua ficção uma cena de Traduções, do irlandês Brian Friel, precisamente aquela em que dois amantes dialogam em diferentes línguas, embora, teatralmente, partilhem uma mesma língua. É talvez a peça que, nas suas nove cenas e na sua opção por dois espaços de representação, embora economicamente sinalizados, mais desafia a sua classificação como "forma breve". A sua selecção encontra, talvez, justificação na unidade da convenção linguística adoptada e na urgência da situação dramática vivida numa pensão de Lisboa, durante a Segunda Guerra Mundial, entre um judeu alemão perseguido, em busca de uma "passagem" para o outro lado do Atlântico, e Maria, a criada da pensão. Tendo sido criada no âmbito de uma oficina de escrita dramática, orientada por Luísa Costa Gomes, Passagem foi, entretanto, objecto de tratamento cénico, num contexto pré-profissional, em Julho de 2002, envolvendo um conjunto de alunos da Academia Contemporânea do Espectáculo, Porto, sob direcção de João Pedro Vaz.