Teoria da Fronteira - José Tolentino Mendonça
Teoria da Fronteira - José Tolentino Mendonça
MÃOS VAZIAS
Mãos vazias são salva-vidas para tempos difíceis
uma afeição a salvo dos especuladores
o seu vazio é uma pedra
e se observares bem ela flutua
as mãos vazias são selvagens na sua beleza
duras mesmo se vulneráveis
são o esconderijo ideal para guardares relâmpagos
e verdades ferozmente concisas
as mãos vazias esperam não o fim mas a fresta
alagadas na ferrugem
e preferem enlouquecer a acreditar
que a realidade é só aquilo que se vê
A primeira parte do novo livro de poesia de José Tolentino Mendonça abre com esta epígrafe de Gloria Anzaldúa: «Penso na fronteira como o único ponto da terra que contém todos os outros lugares dentro de si». Mote para uma poderosa reflexão sobre o amplo significado da palavra fronteira, nas suas múltiplas dimensões e como metáfora emblemática da humanidade, ontem como hoje. Ponto de partida para viagens por terras e cidades, por tempos passados e presentes, peregrinando pelos lugares da amizade, pela solidão, pelo silêncio, pelo corpo.